Você tem um vídeo de música favorito? Pois saiba que quatro em cada cinco brasileiros têm o seu, e, por mais variados que sejam os estilos, o que esses vídeos possuem em comum pode ser resumido em uma palavra: contexto.
Contexto são histórias que acompanham o vídeo. E quanto mais ricas elas forem, mais engajamento causam, geram outros vídeos e acabam tornando o produto mais popular. Essa é uma das principais conclusões do estudo que traçou um raio-x da forma como os brasileiros se relacionaram com o YouTube em 2018, o ano que viu grandes astros, como Queen e Lady Gaga, serem superados por MC Kevinho e que explicitou a mudança na forma como consumimos música.
Um continente chamado música
Música é assunto sério e de dimensões continentais no YouTube: mensalmente, 55 milhões de pessoas apaixonadas por música assistem aos vídeos da plataforma, que tem capacidade para impactar mais de 112 milhões. E quase todos os usuários – 92% deles – assistem a vídeos musicais, a maioria em smartphones.
Eles também assistem com regularidade: mais da metade das pessoas conhece novas canções pela plataforma e vê pelo menos um vídeo de música todos os dias. Por outro lado, menos de 10% dos frequentadores do YouTube dizem que não se interessam por vídeos de música.
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As pessoas geralmente chegam aos vídeos procurando o artista pelo nome. Buscas pelo nome da música ou do estilo musical vêm bem depois.
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Ainda para contextualizar o panorama brasileiro, vale a pena olhar a fundo o que foi mais buscado no YouTube em 2018:
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Examinando quais foram os artistas mais buscados nos dois estilos musicais mais ouvidos no ano passado, temos os seguintes rankings:
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Um ponto forte do YouTube é seu enorme acervo. Isso permite que todo mundo encontre algo de que goste e faz a plataforma ser a favorita de pessoas com os gostos mais variados, de seniores a membros da Geração Z, como mostram as buscas segmentadas por idade:
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A mesma coisa vale para regiões. Repare que entre as 10 buscas musicais mais populares no Rio de Janeiro e em Pernambuco, nenhum nome se repete nos dois estados.
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Sim, mas o que isso tudo significa?
Você viu as segmentações por artistas, estados, faixas etárias e gêneros musicais, mas elas não contam toda a história. Isso porque cada vez mais o gosto musical das pessoas é fluido: quem gosta de sertanejo também ouve funk e possivelmente K Pop, por exemplo, com muito menos preconceito e estereótipos do que havia no passado.
Segmentar só por esses critérios exclui muita gente e pode levar você a apostar em dados que não retratam o público em toda sua complexidade.
É preciso ver o cenário de outro ângulo, e a melhor forma de enxergar diferenças na audiência é por comportamento – ou entender as tendências que se formam e incluem elementos diversos, de moda, o tipo de celular, roupas, cortes de cabelo, forma de se comunicar, entre outros. O contexto faz você entender mais a fundo como pensam e o que querem as pessoas.
Um sintoma do quanto o mundo da música está mudando rápido é o fato de que dificilmente veremos o surgimento de uma nova Anitta – cantora que construiu uma carreira de sucesso, e nem faz tanto tempo assim, baseada em um modelo que já está ultrapassado, uma estratégia que se baseia em altos investimentos e elementos externos.
Quem é mais famoso no YouTube: Lady Gaga ou MC Kevinho?
O exemplo da Anitta fica mais fácil de entender ao examinarmos dois casos: Lady Gaga e MC Kevinho. A estrela internacional adotou uma estratégia mais convencional, enquanto o músico paulista foi por um caminho oposto.
Ela apostou em eventos ocasionais para impulsionar sua visibilidade. Conseguiu, de fato, picos de audiência quando o filme para o qual compôs a trilha – Nasce Uma Estrela – foi lançado e também quando levou para casa o Oscar de melhor música, por “Shallow”.
Mas Lady Gaga teve praticamente a metade do resultado alcançado pelo jovem de Campinas, muito menos conhecido do grande público. MC Kevinho lançou várias músicas nesse período, seja sozinho, seja em parcerias com outros – em média uma a cada 40 dias. Isso fez com que o interesse do público não diminuísse, se mantendo alto durante o ano todo.
MC Kevinho fez mais ainda: teve sua audiência bastante amplificada pelos ecossistema gerado pelas suas músicas, ou seja: coreografias, covers, versões ao vivo, lyric videos, registros de bastidores, reações de creators, paródias e remixes. Só o ecossistema da música “Terremoto” – parceria, veja só, com Anitta – gerou mais de 14 milhões de visualizações.
Das duas abordagens, a mais bem-sucedida foi a que escolheu uma estratégia always on. A que apostou em fatores externos – Oscar, lançamento de filmes –, além de ser bem mais cara e trabalhosa, rendeu menos.
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Kevinho pode ter 20 anos de idade, mas não é novato: desde os 13 ele emplaca vídeos no YouTube. Há três anos ele é um artista da Kondzilla, outro fenômeno que se fez na plataforma. Hoje Kondzilla tem mais de 50 milhões de inscritos e é o maior canal do YouTube Brasil. Ele chegou lá ao entender a força de contar histórias com contexto e da dinâmica always on.
Qual a força dos festivais?
Quando se pensa no ano musical, os grandes festivais são sempre uma referência. Mas qual o seu tamanho e como eles chamam a atenção da audiência? No caso do Lollapalooza 2019, dá para perceber um recorte claro no interesse do público, no mês do evento e nos outros seis que o antecederam.
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Seis meses antes do Lollapalooza, as buscas foram mais genéricas: pelo menos 70% usaram os termos Lollapalooza ou Lollapalooza 2019. Já durante o mês do festival, as pessoas foram atrás de informações mais direcionadas: como assistir ao vivo (a principal busca, com 47%), serviços como ingressos, lineups, descontos, promoções e horários.
Vídeos ao vivo podem ser protagonistas durante a época de festivais, mas no acumulado do ano ficam bem para trás quando pensamos nos outros produtos que compõem um ecossistema: para ser preciso, são nove vezes menos procurados do que vídeos de coreografias. Ficam atrás também de vídeos de covers, letras, paródias e remixes.
Acabou o controle: o mundo que acontece debaixo do radar
O que Kondzilla também entendeu é que existe um enorme universo que produz e consome música nas periferias, fora do radar da grande mídia, ignorado pelo mainstream. E que as histórias que interessam as pessoas também vêm de lá.
Como foi o caso de outros dois adolescentes de um bairro humilde de Porto Alegre. Meio por brincadeira, em janeiro eles postaram um vídeo falando de ticolé: aquele geladinho popular com sabor de fruta. O vídeo Ticolé é bom viralizou e só no primeiro mês teve 20 milhões de views. Durante esse período, a dupla conquistou 1 milhão de seguidores.Play video
O que eles fizeram? Investiram em contexto e always on. Lançaram sequências bem humoradas – eles têm 14 e 15 anos e um humor típico da idade –, mantendo o interesse do público vivo. Variações do tema Ticolé rendem passinhos, remixes e contam um pouco das aspirações e do cotidiano das periferias, como o sonho de ter um carrão importado.Play video
Mas o que parecia brincadeira gerou um ecossistema bem sério, com versões, remixes e continuações da música. Já são mais de 76 milhões de visualizações alcançadas, sem TV, gravadoras ou uma enorme equipe de profissionais de marketing pensando cuidadosamente nos próximos passos da carreira.
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Quem sai na frente?
O YouTube constrói marcas e dá visibilidade, e a música é um dos melhores pontos de partida, já que a grande maioria das pessoas consome música na plataforma com frequência. É um ótimo jeito de conquistar a atenção das pessoas em um mundo cada vez mais saturado de informação.
Mas é preciso mais: as pessoas hoje seguem histórias e elas podem surgir de todos os cantos. Outra lição importante é apostar no always on. Além de contar histórias, fortalecer o contexto, ele não deixa a peteca – ou o interesse do público – cair. Kevinho e os que conseguem mais sucesso na plataforma entenderam que precisam trabalhar o ano todo, educando as pessoas a aguardarem o próximo conteúdo, que pode vir tanto dele, artista, como do ecossistema em torno do que ele produziu, fazendo o bolo crescer como um potente fermento natural.
Nesse caso, mais do que criar campanhas caras ou patrocinar o artista da hora, o que vale mais é ter uma boa história para contar. E contá-la em etapas, com honestidade e olhos e ouvidos abertos para o que o público quer.
As marcas que quiserem se associar a artistas têm que entender que precisam desenvolver as histórias junto com esses artistas, em um trabalho constante, de desenvolvimento de lifestyle. Para acertar o tom e não dançar fora de hora, é preciso estar atento ao universo do YouTube.
Por: Gustavo Casas, Consumer Insights Lead, Google Brasil
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