Quantas vezes você escutou os termos diversidade e inclusão nos últimos meses? Provavelmente várias. O número de buscas no YouTube por eles aumentou 71% e 24% respectivamente, só no último ano. Eles passaram a ser discutidos pela indústria da beleza, abraçados pelas artes e observados pelo mercado como um todo em diferentes esferas, gerando debates apaixonados e polêmicos que, acima de tudo, ajudam a moldar os nossos tempos.
Mas será que estamos abrangendo os pontos mais importantes dessa discussão? Nosso foco está no que realmente importa na hora de promover a diversidade e a inclusão? Ou melhor: será que a comunidade LGBTQIA+ está efetivamente inserida nesse debate? Qual é a percepção dela sobre a maneira como o tema vem sendo abordado? Quais serão os maiores desafios dessa discussão daqui pra frente?
Para entender melhor esse universo a partir da perspectiva de quem o vive na prática, o Google e a Box 1824 conduziram um estudo qualitativo e abrangente1. Como parte da metodologia, foram recrutados entrevistadores de dentro e de fora da comunidade LGBTQIA+, com e sem “lugar de fala” (ou seja, “propriedade e vivência”) em ambos os temas. O resultado? Um retrato sobre as diferenças entre o que é realidade e o que é percepção dessas questões, além de aprendizados que podem ajudar as marcas a encontrar caminhos para se posicionar de forma construtiva, honesta e coerente com seus valores dentro de um cenário em transformação.
COMEÇANDO PELO COMEÇO: POR QUE EXISTEM TANTAS LETRAS NA SIGLA?
Se é uma busca por inclusão, por que precisamos de tanta diferenciação? Exatamente para mostrar que as diferenças existem. Apesar de estar claro o significado de cada letra entre os especialistas e ativistas da comunidade, não há um consenso sobre qual sigla é a mais adequada para reconhecer cada grupo, muito menos sobre o tamanho que a nomenclatura acabou atingindo ao longo dos anos. A primeira sigla foi criada na década de 70, e desde então passa por atualizações constantes.
O importante é compreender que a inclusão de todos os grupos aparece como um primeiro passo na busca por visibilidade para as suas existências. Assim, incluir uma letra passa a ser parte significativa do processo para gerar visibilidade e reconhecimento.
DIVERSIDADE NO BRASIL: EXPECTATIVA x REALIDADE
Pode parecer contraditório. Apesar de o termo “diversidade” ser muito usado, parte da população LGBTQIA+ não se sente conectada a ele, e até ironiza seu uso mais amplo. O estudo indica que quanto mais esse público sofre discriminação, menos ele acredita que nossa sociedade é diversa.
Já a percepção de pessoas cis² e hétero, dentro do grupo estudado, é diferente – especialmente nas classes mais altas. Em princípio, boa parte dos entrevistados categoriza a homofobia como negativa, e a diversidade, aceitável. Mas nas entrevistas, mesmo entre os que acreditam não ser homofóbicos, é possível perceber a manifestação de vieses inconscientes. Um sinal de que frequentemente a norma – ou seja, os padrões estéticos, culturais e de comportamento mais “aceitos” na sociedade – fala mais alto que a diversidade em si.
QUANTO MAIOR A DISCRIMINAÇÃO, MAIOR O ENVOLVIMENTO
“Você é trans/gay/lésbica? Nem parece.” Essa fala ilustra um conceito chamado “passabilidade”, ou seja, “o quanto um membro da comunidade LGBTQIA+ aproxima-se da norma”. Ele está relacionado à maneira como a pessoa é lida pela sociedade. Uma mulher trans que tenha características físicas parecidas com as de uma mulher cis, por exemplo, tem uma passabilidade maior. E por que isso é relevante?
O estudo mostrou que, quanto mais perto a pessoa está da norma, menores são seus relatos de discriminação – por vezes, foi possível notar até um certo distanciamento das questões e das pessoas que compõem os outros perfis da sigla. Da mesma forma, quanto mais longe de uma “norma social predominante” a pessoa estiver, mais excluída ela possivelmente se sentirá e mais sujeita às dificuldades relacionadas ao preconceito.
Para ajudar a ilustrar essa dinâmica, o estudo gerou um Grid da Diversidade Sexual que relaciona a sexualidade com várias outras dimensões (demográficas, socioeconômicas, étnicas, de gênero) e que vai nos mostrando como essas interseccionalidades vão gerando, cada vez mais, esse distanciamento de um “padrão social ideal”.
O grid reflete os preconceitos ligados a gênero, etnia e classe social: de acordo com ele, um homem gay branco, com nível superior, tende a ser menos discriminado do que uma mulher lésbica negra. E isso, junto com seu grau de passabilidade, vai determinar o quanto a pessoa se envolve com os seis assuntos mais comentados, reivindicados e urgentes para a população LGBTQIA+ hoje:
1) VIOLÊNCIA: DO PRECONCEITO AO GENOCÍDIO LGBTQIA+
2) POLÍTICA: DA INVISIBILIDADE À FRAGILIDADE DE DIREITOS
3) SAÚDE: DO ACESSO BÁSICO RESTRITO À VIDA QUE ACABA
4) TRABALHO: DA DISCRIMINAÇÃO À EXCLUSÃO DO MERCADO
5) EDUCAÇÃO: DO COMBATE À FOBIA LGBTQIA+ À EXCLUSÃO ESCOLAR
6) FAMÍLIA: DA EXCLUSÃO À IMPOSSIBILIDADE DE CONSTITUIR UMA
RESULTADO: O CICLO DA EXCLUSÃO
O que o estudo conclui é que essas seis agendas frequentemente se inter-relacionam, muitas vezes em uma relação destrutiva de causa e efeito. Nas diferentes trajetórias LGBTQIA+, esse Ciclo de Exclusão, na maioria dos casos, começa na família e culmina em violência. Casos de exclusão no próprio núcleo familiar são mais comuns do que imaginamos, afetando diretamente a assiduidade escolar, por exemplo. Na escola, além de episódios de bullying contra o jovem LGBTQIA+, também se repete o movimento de exclusão. Nos dados oficiais, ficam registrados somente os números de evasão escolar, sem esclarecimento dos motivos.
Por consequência, a falta de inclusão e acolhimento já nesses primeiros anos de vida se reflete no acesso à educação e, como um efeito dominó, limita as chances de inserção no mercado de trabalho. Somado a isso, há também a falta de representatividade política, ou seja, direitos básicos que não são pautados e discutidos na esfera pública, gerando mais vulnerabilidade e violência.
VISIBILIDADE E NORMALIZAÇÃO: SUPERPODERES BÁSICOS DA COMUNICAÇÃO
Apenas falar sobre o problema é uma solução? Sabemos que não. Mas é um passo importante. O YouTube hoje tem 2,3 milhões de vídeos com conteúdo LGBTQIA+. Criadores da comunidade ou conectados a ela constroem todos os dias narrativas que mostram suas realidades e sensibilizam as pessoas em relação ao Ciclo da Exclusão.
Dentro do YouTube, as oportunidades são diversas. Não apenas para entender mais sobre esse universo, mas também para colaborar com a normalização da existência dessas pessoas. Elas têm audiência por falar sobre a agenda de inclusão, mas fazem um trabalho muito importante ao retratar que a existência delas não é unidimensional. São pessoas reconhecidas como especialistas em diferentes temas, como games, entretenimento, beleza e muitos dos outros assuntos explorados na plataforma.
PARTE DA TRANSFORMAÇÃO PASSA POR CRIAR UM CICLO DE INCLUSÃO. E AS MARCAS, PODEM AJUDAR?
Em uma palavra: sim. Os benefícios da diversidade para as marcas são muito maiores do que um olhar para a comunidade LGBTQIA+ enquanto mercado consumidor. Ter uma equipe mais diversa efetivamente trabalhando para sua marca facilita conexões mais empáticas com as pessoas de uma forma geral.
É importante considerar a relação que se cria quando se percebe um alinhamento legítimo às questões vividas por pessoas da comunidade. Isso pode ser observado inclusive em termos práticos: dos quase 18 milhões de brasileiros que se identificam com alguma das letras da sigla, 50% se dizem dispostos a priorizar uma marca que apoie a causa, mesmo contra ofertas mais vantajosas3.
Existe um passo simples e eficiente que está ao alcance das marcas e que foi o campeão de citações durante o estudo: empregar pessoas da comunidade.
Quando começa no trabalho, a inclusão tem potencial de quebrar as cadeias destrutivas. Ter poder aquisitivo permite estudar mais, abre oportunidades de crescimento profissional e pessoal. Em seguida, vêm o acesso a serviços de saúde e a ocupação de espaços políticos em busca de direitos. Por fim, já com uma vida mais estruturada, a pessoa LGBTQIA+ pode se sentir mais protegida das diferentes formas de violência.
Outras iniciativas consideradas determinantes para avançar a agenda inclusiva:
O QUE MINHA MARCA JÁ PODERIA FAZER HOJE?
Em um país onde a sociedade ainda está aprendendo a acolher as diferenças, é importante ressaltar que onde há muito a ser feito também há muitas oportunidades. E as marcas têm um papel importante na transformação do cenário da comunidade LGBTQIA+.
A pesquisa nos trouxe vários direcionamentos úteis para refletir e agir de maneira positiva em relação à agenda inclusiva. Dividimos abaixo alguns deles, que podem ser tanto pontos de partida como de inspiração para outras ações.
Quando o assunto é diversidade, é comum existir a cobrança de que o discurso venha acompanhado de ação. No caso das parcerias – com iniciativas que se dedicam aos temas da agenda de inclusão –, é importante considerar ações que façam a diferença de maneira efetiva na estrutura em questão, indo além da doação de lucros. A marca pode promover treinamentos para aumentar o alcance da iniciativa que visa apoiar? Pode construir novos espaços físicos? Melhorar os que já existem? O que aceleraria a mudança além de recursos financeiros?
Avaliar o contexto e discutir possíveis melhorias com as partes envolvidas é fundamental.
Em todos os casos, o primeiro passo deve ser olhar pra dentro: estou apoiando a agenda de inclusão, mas estou fazendo o mesmo com os colaboradores da minha empresa?
Retratar algo a partir do ponto de vista de quem vive, e não apenas de quem observa. Para criar conexões com verdade e emoção, a recomendação é buscar histórias e experiências verdadeiras, dando espaço para que os próprios protagonistas também gerem narrativas. Aqui entra a importância de ter representatividade no time – da idealização à produção.
Simplificar a linguagem para que a mensagem alcance todos os públicos é essencial. Quando falamos de diversidade, é preciso pensar com o objetivo de sensibilizar e engajar as pessoas além do público LGBTQIA+.
Seja na hora de buscar parcerias com Criadores ou mesmo de escolher a melhor maneira de executar sua mensagem, é importante lembrar: o público LGBTQIA+ não é unidimensional. Ele não deve ser considerado só quando o assunto é diversidade. Sua campanha é sobre games? Viagem? Beleza? As pessoas LGBTQIA+ atuam, consomem e têm interesse em diferentes áreas. A representatividade real precisa partir dessa premissa e também precisa considerar as diferentes classes sociais, raças, identidades de gênero e orientação sexual que compõem a comunidade, ajudando a garantir a visibilidade do maior número de existências possível.
É necessário entender que as realidades são diferentes, ainda que exista uma agenda comum. Vale se atentar ao cuidado de não colocar todas as letras da sigla “em um mesmo barco”.
Há um abismo de conhecimento entre boa parte das pessoas cis e hétero sobre a realidade LGBTQIA+. Até mesmo dentro da comunidade há desinformação sobre as agendas. Produzir conteúdo que mostre essas diferenças é uma oportunidade de se diferenciar e promover a mudança da conscientização e da cultura sobre o tema no Brasil.
Por: Think with Google
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