Está em curso um fenômeno novo para o país: o amadurecimento em massa da população. Mas é preciso correr, pois a janela de oportunidades tem data para fechar
Por Nicholas, Vital, de Exame
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Ronaldos e Giseles à parte, a maioria dos mortais segue um roteiro de vida semelhante. Primeiro experimentamos as delícias da infância e da adolescência. Depois, chega a hora de começar a trabalhar, um momento marcado por muito esforço e pouco dinheiro. Com o tempo, as oportunidades vão surgindo e o desafio é conseguir garantir um descanso tranquilo no período final. E assim passamos de geração em geração. Também os países seguem uma trajetória semelhante, com graus diferentes de sucesso. Numa fase inicial, nações jovens têm uma fatia grande da população abaixo da idade de trabalho. Com o tempo, as crianças crescem e começam a trabalhar. É um período ideal para aproveitar o impulso e crescer. Depois vem a fase do envelhecimento, em que o ímpeto econômico se esvaece. Se tudo der certo nesse caminho, haverá, então, riqueza suficiente para financiar o sossego dos idosos.
O Brasil já foi uma nação jovem. E seremos, no futuro, um país velho. A boa notícia é que estamos — agora — no auge do período produtivo. Encontra-se em curso um fenômeno demográfico e social novo para o país: o amadurecimento em massa da população. O crescimento populacional vertiginoso ficou para trás. Após crescer geometricamente por dois séculos, o número de brasileiros aumenta cada vez menos e não deve ultrapassar a marca de 220 milhões. Ao mesmo tempo, com expectativa de vida de 73 anos, o país tem hoje dois terços da população entre 15 e 64 anos — a faixa etária considerada economicamente mais produtiva. A proporção dos que estão em idade de produzir vai continuar a crescer até 2022, quando atingirá um pico de 71%. A previsão é que nessa data o número de brasileiros em idade ativa passe dos atuais 130 milhões para 147 milhões. As chances de negócios abertas por essa transformação silenciosa são enormes. “Se em dez anos não abrirmos 100 milhões de novas contas, é porque algo deu errado”, diz Luiz Carlos Trabuco Cappi, presidente do Bradesco. Segundo estimativa da Federação Brasileira de Bancos, o número de agências bancárias no país deve crescer 50% na próxima década, o que significa a criação de cerca de 150 000 postos de trabalho. O crescimento no setor bancário é apenas um exemplo do salto esperado em inúmeros mercados na próxima década.
“Essa é uma chance única na história de qualquer país”, disse a EXAME Ronald Lee, diretor do departamento de demografia e economia da Universidade de Berkeley e membro da Comissão Americana para Estudos do Envelhecimento. A chance a que Lee se refere é batizada pelos especialistas de bônus demográfico — a fase com o máximo possível de gente trabalhando. Uma projeção realizada pelos professores Cássio Turra e Bernardo Queiroz, da Universidade Federal de Minas Gerais, mostra que o Brasil tem um potencial de crescimento de 2,5% ao ano gerado exclusivamente pelo bônus demográfico. Outra conta, feita por Marcelo Neri, pesquisador do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas, sugere um aumento de até 2,7% ao ano na renda média dos brasileiros em função do bônus e do aumento da escolaridade, iniciado nos anos 90. No cenário elaborado por Turra e Queiroz, o Brasil, se crescer apenas à média anual de 2,5% propiciada pelo bônus demográfi co, chegará a 2030 com um produto interno bruto de 3,3 trilhões de dólares, 50% maior que o atual. Mas o país tem crescido mais que isso — e os economistas avaliam que será possível manter um ritmo de 4,5%. Isso elevaria, no mesmo prazo, o PIB para 4,8 trilhões de dólares, o sufi ciente para alcançar um padrão de renda equivalente ao que Portugal tem atualmente. Numa hipótese mais otimista, de o bônus ser aproveitado para impulsionar reformas mais profundas, em duas décadas o Brasil atingiria o nível de renda per capita atual da Espanha e teria um PIB de 7 trilhões de dólares. “Os brasileiros estão diante de uma oportunidade de ouro, mas ela é temporária. Após duas décadas, o envelhecimento da população inverterá a curva e fará a proporção de inativos subir. Por isso, para tirar o máximo proveito até lá, o Brasil deve investir fortemente nas novas gerações, em especial provendo boa educação básica”, diz Lee. O recado é claro: temos mais 20 anos para fazer a lição de casa, modernizando a economia e melhorando a qualidade da educação, e, assim, nos tornar uma nação rica. Caso contrário, estaremos no pior dos mundos. Corremos o risco de envelhecer sem ter conseguido integrar o clube dos desenvolvidos — e aí será muito mais difícil chegar lá.
O bônus tem como origem uma guinada no comportamento das famílias brasileiras. Desde meados dos anos 60, tem havido uma queda progressiva no tamanho das famílias. A média de filhos por mulher, que era de seis há meio século, caiu até chegar a menos de dois hoje. A presidente eleita Dilma Rousseff — de quem se espera um conjunto de políticas para aproveitar ao máximo o bônus demográfico — é um exemplo da nova mulher brasileira. Teve apenas uma filha, a qual, por sua vez, recentemente lhe deu o primeiro neto. A idade média da população, antes inferior a 20 anos, atualmente está próxima de 29 — e vai continuar a crescer. A pirâmide demográfica mudou de forma e agora é uma figura cada vez mais arredondada. No ponto atual, a maioria dos que eram jovens nas décadas anteriores ainda não chegou à terceira idade e constitui uma inédita geração de brasileiros mais maduros e que estão no auge de sua carreira profissional. O resultado é que a proporção entre pessoas que não trabalham e as que são ocupadas caiu de mais de sete inativos (seja criança, seja idoso) para cada grupo de dez trabalhadores, há 20 anos, para menos de cinco para dez. No auge do bônus, em 2022, essa proporção será de quatro para dez. Quando há menos gente que precisa ser sustentada, a abundância de população em idade ativa dinamiza a economia e gera recursos adicionais que podem ser revertidos em poupança e investimento. Isso reforça o crescimento econômico e gera oportunidades em inúmeros mercados.
A mudança do perfil demográfico da população brasileira deve fazer com que alguns setores da economia experimentem um ritmo de crescimento acelerado na próxima década, o que pode colocar o Brasil entre os líderes globais em vários segmentos. Os cosméticos são um bom exemplo. Hoje, o Brasil é o terceiro maior mercado de produtos de perfumaria e beleza do mundo, atrás de Estados Unidos e Japão. Caso a estimativa de crescimento do setor se confirme — 9,6% ao ano, de acordo com uma estimativa feita pela consultoria Euromonitor a pedido de EXAME —, o mercado brasileiro de cosméticos deverá chegar a 108 bilhões de dólares em 2020, quase o dobro do observado atualmente nos Estados Unidos. “Nossos consumidores, em sua maioria, são maduros”, diz José Vicente Marino, vice-presidente de negócios da Natura, a maior empresa de cosméticos do país. “Boa parte de nosso crescimento nos últimos anos já pode ser atribuída ao bônus.” O envelhecimento da população também deve impulsionar o segmento de serviços médicos, que inclui gastos com consultas, exames e hospitais. Hoje, os brasileiros gastam pouco mais de 56 bilhões de dólares, montante que deve alcançar 112 bilhões em 2020, mais do que o gasto atual da Alemanha, em torno de 90 bilhões de dólares. O gasto com educação, segundo as projeções da Euromonitor, também deve dobrar na próxima década, de 91 bilhões de dólares para 182 bilhões.
Para as empresas, um dado central é o perfil do brasileiro médio daqui a uma década, quando o bônus demográfico estiver empurrando o país com força máxima. Muito provavelmente, será próximo ao de Ana Rita Mazza Menani. Aos 33 anos de idade, casada, com dois filhos, formada em comunicação social, ela e o marido, Rogério, têm uma pequena gráfica em Monte Alto, no interior paulista. Juntos eles dispõem de uma renda em torno de 8 000 reais por mês. Moram numa casa confortável e, na garagem, têm dois carros e duas motos. Dentro de casa, não faltam eletrodomésticos, móveis e computador. Os filhos, de 7 e 13 anos, estudam em escola particular, fazem aulas de inglês, artes, música e esportes. “Investimos cerca de 25% da renda familiar na educação deles”, diz Ana Rita. “Se tivéssemos mais filhos, seria difícil manter o padrão. As pessoas da minha geração não têm condições de ter mais que um ou dois filhos.” Embora muito tenha se falado sobre o crescimento na base da pirâmide, o exemplo de Ana Rita ilustra que a ascensão econômica em curso no país legará uma estrutura social com preponderância das classes média e alta. Nessa nova sociedade, algumas tendências comportamentais começam a ser detectadas. A importância crescente dada à educação dos filhos é uma delas. O desenvolvimento esperado para as próximas décadas está atrelado a fortes investimentos em educação e formação de mão de obra qualificada — uma das consequências diretas do bônus. “Saímos da baixíssima escolaridade para um nível menos ruim, e isso já está jogando a favor do desenvolvimento há um tempo”, afirma Neri, da FGV. “Nosso retrato provavelmente seria bem pior se não fosse isso. O que precisamos fazer é avançar com mais ambição no setor de educação, para não desperdiçar o bônus.”
Essa necessidade faz com que as escolas constituam um mercado que evidentemente está entre os que mais proliferam atualmente no Brasil. De acordo com a Euromonitor, esse setor deve crescer quase 10% ao ano no Brasil até 2020, quando alcançará 400 bilhões de reais. A expansão tem atraído investidores estrangeiros principalmente para atuar no ensino superior. O grupo americano DeVry chegou ao país há três anos. Instalou-se na Região Nordeste e já conta com 14 000 alunos em suas quatro unidades. “Enxergamos uma grande oportunidade no mercado brasileiro de educação”, diz Carlos Filgueiras, presidente do braço local do DeVry. “O potencial de crescimento é muito grande. Hoje, apenas 30% dos jovens brasileiros entre 18 e 22 anos estão na faculdade. Na Grécia, o índice é de mais de 90%.” De acordo com ele, o efeito do bônus já é perceptível, mas poderá ser mais intenso porque as classes C e D estão começando a ter acesso às universidades. “Isso deve impulsionar o setor nos próximos anos”, diz.
Potencial a ser descoberto
Curiosamente, muitas empresas ainda não atentaram para o potencial de mercado aberto pela mudança na demografia brasileira. Recentemente, ao promover por seis meses um estudo com seus 100 executivos de nível mais alto para identificar tendências e planejar os próximos dez anos, o grupo de engenharia Promon descobriu o bônus. “O tema da demografia causou frisson nas nossas reuniões”, diz Luiz Fernando Rudge, presidente da Promon. “As pessoas não percebem seu efeito no dia a dia, mas vimos que, ao longo das décadas, o impacto é dramático.” A Promon identifica áreas de negócios que serão particularmente atraentes num cenário de amadurecimento da população, como as de saúde e bem-estar. “Podemos investir na construção e na operação de hospitais e condomínios para pessoas mais idosas”, afirma Rudge. Além disso, com a perspectiva de um crescimento econômico mais consistente, diversos setores de infraestrutura em que a Promon atua, de energia a telecomunicações e tecnologia da informação, também deverão ser positivamente afetados.
De acordo com um estudo da consultoria Ernst & Young, a mudança do perfil demográfico da população brasileira deve dar ainda mais fôlego ao setor de construção civil. Estima-se que, todos os anos, cerca de 1,7 milhão de novas famílias sejam formadas no país. Até 2030, serão pelo menos 35 milhões de novas famílias, principalmente da emergente classe C, que precisarão de um lugar para morar. Trata-se de outra tendência que começa a ser detectada: o surgimento de famílias pequenas e em franca ascensão social. As construtoras já perceberam o fenômeno e vêm adequando seus produtos aos novos consumidores. “As famílias estão ficando cada vez menores. Consequentemente, os apartamentos também devem ficar mais compactos”, diz Antonio Carlos Ferreira, diretor de incorporações da Gafi sa, uma das maiores construtoras do país. Em 2007, as famílias tinham, em média, 3,1 pessoas. Em 2030, prevê-se que haverá apenas 2,4 pessoas por residência. O operador logístico mineiro Lando Tavares, de 34 anos, comprou seu primeiro apartamento há aproximadamente um mês. Casado há quatro anos e pai de uma menina de 2 anos, ele aproveitou um aumento salarial e a oferta abundante de crédito para financiar em 25 anos um imóvel avaliado em 100 000 reais. Os Tavares representam a nova família brasileira — pequena e mais preocupada com a qualidade de vida.
Uma população mais velha traz também mudanças em termos de objetos de desejo. Um segmento crescente é o formado por homens e mulheres maduros e com dinheiro para gastar. O envelhecimento costuma tornar os consumidores mais exigentes. Para as montadoras de automóveis, isso deve produzir uma alteração na demanda. A participação de veículos maiores e mais equipados deverá crescer consideravelmente nos próximos anos, com alta nas vendas de sedãs médios e modelos de luxo. “Eles devem tomar parte do mercado dos populares”, afirma Stephan Keese, sócio da consultoria especializada Roland Berger. “As pessoas mais velhas geralmente têm mais dinheiro e compram produtos melhores.” Atualmente, os veículos compactos respondem por 69% do mercado brasileiro, ante 15% dos sedãs médios. Em 2020, a participação dos populares deve cair para 63%, enquanto a dos médios subirá para 20%. O mercado de carros de luxo também deve dobrar, para mais de 50 000 unidades por ano. “Nos Estados Unidos e na Europa, os carros básicos são mais completos porque são desenvolvidos para uma população mais velha e exigente”, diz Keese. Essa é justamente a aposta que a marca japonesa Nissan fez recentemente para se expandir no Brasil. Instalada no país no final dos anos 90, a Nissan lançou em 2007 o modelo Sentra, aquele que “não tem cara de tiozão”. O sedã, que custa a partir de 55 000 reais, obviamente não tem como público-alvo os jovens. A intenção foi chamar a atenção dos homens maduros, os potenciais consumidores. “Quando chegamos ao Brasil, já sabíamos da tendência de envelhecimento da população. Tínhamos certeza de que o segmento cresceria”, afirma Murilo Moreno, diretor de marketing da Nissan. “O tíquete médio vem subindo. Os carros de luxo estarão cada vez mais presentes nas ruas.”
O exemplo vem da Ásia
A legião de consumidores maduros deve impulsionar o crescimento de mercados antes pouco expressivos. Uma preocupação é envelhecer bem e de forma saudável. Essa nova realidade faz com que a indústria de lácteos, por exemplo, precise de um novo plano de negócios para os próximos anos. Com um mercado infantil cada vez menor, não faz mais sentido investir milhões de reais em produtos com poucas possibilidades de crescimento. O foco agora são os leites funcionais, ricos em cálcio e outras vitaminas e consumidos por adultos. “Esses produtos devem crescer 300% nos próximos cinco anos”, afi rma Fernando Falco, presidente da Leitbom, controladora da marca Parmalat no Brasil. Segundo ele, nos próximos dois anos a Parmalat deve lançar pelo menos sete novos lácteos funcionais e só dois produtos voltados para o público infantil. O crescimento do número de adultos em busca de uma vida mais saudável beneficia uma gama de empresas que vai muito além das fabricantes de alimentos. O Brasil já é o segundo mercado do mundo para as academias de ginástica, só atrás dos Estados Unidos.
Todos os países hoje considerados desenvolvidos se benefi ciaram de mudanças no perfil populacional para atingir estágios mais elevados de renda e qualidade de vida. Na Europa, no Japão e nos Estados Unidos, a transição demográfica foi mais lenta, tendo se iniciado com a revolução industrial. Lá, as vantagens começaram no século 19, com um aumento da população gerado pelas conquistas científicas e pelo desenvolvimento da infraestrutura urbana de saneamento. Foi uma evolução que se estendeu ao início do século 20, com a redução da mortalidade infantil e a expansão do acesso a serviços médicos e educação. O impulso inicial, de ampliação das populações, depois foi contido com a queda da natalidade. Na Ásia, excetuando o Japão, os avanços na qualidade de vida da população chegaram após a Segunda Grande Guerra. Mas, com as tecnologias e os conhecimentos já disponíveis, a adoção de melhorias foi intensa, o que gerou uma transição rápida. Em países como Coreia do Sul, Singapura, Hong Kong e Taiwan, a mudança demográfica iniciada nos anos 60 gerou uma ampliação da força produtiva que serviu de base para a decolagem das economias. Os governos desses países souberam perceber que uma população com mais expectativa de vida também precisaria ser mais educada e que o ambiente de negócios precisaria ser nutrido. A transformação que se viu em três décadas fez os quatro países merecerem o apelido de Tigres Asiáticos. Um estudo realizado pelos pesquisadores David Bloom e Jeffrey Williamson, da Universidade Harvard, concluiu que o bônus demográfico gerou um terço do crescimento dos quatro tigres entre 1965 e 1990. “A mudança no perfil da população foi determinante para o milagre econômico asiático”, afirma Bloom. “Até então, esses países cresciam lentamente devido ao peso excessivo de uma população muito jovem.” O estudo mostra que, durante a transição, a massa local de trabalhadores cresceu a um ritmo de 2,4% ao ano, enquanto o crescimento total da população era de 1,6%.
A Coreia do Sul lançou as bases de seu sucesso antes mesmo de chegar ao bônus. Devastado pela guerra dos anos 50, o país passou a investir em educação e fez uma série de reformas para que sua economia deslanchasse. Mais tarde, em meados dos anos 80, quando chegou ao período de transição demográfica, já estava devidamente preparado. Em três décadas, os sul-coreanos multiplicaram por 8 sua renda per capita, para perto de 20 000 dólares, o dobro da brasileira, e entraram para o clube dos países ricos. Atualmente, quem melhor está aproveitando a transição demográfica é a China. Graças às políticas draconianas de controle de natalidade introduzidas pelo governo na década de 70, o país tem colhido os frutos de uma estrutura etária que, por ora, é favorável — há, desde os anos 90, cada vez menos crianças e cada vez mais adultos aptos a produzir. Todos os anos, milhões de chineses entram para o mercado de trabalho e engrossam o já enorme contingente de mão de obra local. Dar emprego a tanta gente é um desafio, mas o país tem conseguido dar conta. Com custo baixo para produzir quase tudo, a enorme população chinesa é o motor que move a segunda maior economia do mundo. Estima-se que o bônus tenha sido responsável por até 30% do crescimento do PIB da China na última década. Além disso, o fenômeno ajudou a tirar da pobreza cerca de 400 milhões de pessoas nos últimos 30 anos. Assim como o Brasil, a China ainda tem cerca de 20 anos de bônus demográfico pela frente. Mas há uma nítida diferença em como a oportunidade é encarada lá e aqui. “No Brasil, ainda não caiu a ficha de que estamos diante de uma janela temporária”, diz Rogério Rizzi de Oliveira, sócio da empresa de consultoria Monitor Group. “Os chineses correm para manter o crescimento acima de 10% porque sabem que isso só poderá ser feito num prazo curto. Nós, aqui, também precisamos apertar o passo.”
Os desafios para que o Brasil aproveite ao máximo sua janela de oportunidades, porém, ainda são muitos. Não temos uma economia com a modernidade e a eficiência necessárias para gerar crescimento econômico de alta qualidade. “O próximo governo precisará trabalhar muito para que possamos dar um salto. Do contrário, corremos o risco de desperdiçar parte do bônus”, afi rma Rubens Ricúpero, ex-ministro da Fazenda e diretor da Faculdade de Economia da Fundação Armando Alvares Penteado, em São Paulo. Temos as próximas duas décadas para alcançar um padrão de país rico — depois, a janela de oportunidades irá gradualmente se fechar. Se a transição não for devidamente aproveitada, a sociedade brasileira estará de frente para um novo e dramático quadro por volta de 2040: o de uma nação de idosos que não melhoraram sufi cientemente seu padrão de vida e, pior, sem recursos para sustentar a velhice. O alerta sobre esse cenário sombrio é dado hoje pelos países europeus, onde os sistemas de seguridade e manutenção do bem-estar social estão em crise. Isso está ocorrendo mesmo em lugares que alcançaram altos níveis de renda per capita, como França, Reino Unido e Itália, e, de forma pior, nos que não enriqueceram tanto, como Grécia, Portugal e Polônia. Uma questão difícil de ser enfrentada é a da saúde. “O custo para tratar um idoso é muito maior que o de um jovem”, afirma o economista Paulo Tafner, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. “Até 2040, o gasto brasileiro com saúde vai se multiplicar por 3.” Caso o país não se prepare adequadamente, o já deficiente sistema público de saúde entrará em colapso. O mesmo impacto se dá nas contas da deficitária Previdência Social. “É preciso reconhecer que o país não está preparado para ter 30 milhões ou 40 milhões de idosos, como deve acontecer nas próximas décadas”, diz Carlos Eduardo Gabas, ministro da Previdência. Para Ronald Lee, de Berkeley, o Brasil terá de reavaliar seu sistema de aposentadoria, que ele considera provavelmente o mais generoso do mundo em relação ao nível de renda per capita. “Não há dúvida de que há muitos idosos pobres que precisam das pensões, mas eu suspeito que haja muita gente recebendo mais do que precisa”, afi rma Lee. “O modelo atual não será sustentável no futuro.” O custo da Previdência em relação ao PIB já é duas vezes maior que nos Estados Unidos, e a idade média do brasileiro ainda é inferior à dos americanos. São questões que deveriam estar na ordem do dia. Não estão. Fazendo um paralelo com o que o pensador florentino Nicolau Maquiavel dizia do Príncipe, é preciso ter virtù e fortuna — competência e sorte — para triunfar. Tudo indica que a sorte agora está do lado do Brasil. Falta mostrar virtù para aproveitar ao máximo a janela de oportunidades. São 20 anos — e o relógio está correndo.
Fonte: Exame
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